Character Design: Dando luz ao inanimado
Uma avassaladora maioria de jogos eletrônicos, e praticamente todos os RPGs de mesa, se vale de personagens, sejam eles como atores, objetos, aspectos centrais ou codjuvantes. Desde Cloud Strife, de FFVII (FFIX is best FF), até o reles lacaio morto aos montes em jogos como Dante’s Inferno e God of War. Cada personagem, cada ser, é construido por um processo que chamamos de Character Designing – o Design de Personagens.
Meu objetivo é mostrar para os leitores o que é isso e quem faz isso, por quê é tão importante, e dar umas dicas – e de graça, olha só:
Para aqueles que não me conhecem, eu sou Mateus “Hyperion” Farias. Sou colunista principalmente da parte de Adventurer’s Journal aqui do blog, a sessão de RPG, e crio um sistema/cenário de RPG chamado Seruttia faz algum tempo. A novidade é que também trabalho em grupos amadores indie de criadores de jogos, e principalmente como roteirista, system designer, e character designer. Tenho pouca experiência, mas é algo que faço com paixão. Sei os trâmites desse ofício, e quero tentar passar isso.
O design de personagens é um trabalho quase sempre multidisciplinar. Não adianta ser algo desconexo do todo. Se falamos de jogos eletrônicos por exemplo, eu posso construir o conceito de um palhaço divertido super interessante, mas ele nunca vai caber em um universo de fantasia mítica.
Se falamos de RPG, tenho que conhecer o cenário de jogo, a campanha e tudo que está em jogo para construir um personagem convincente e de qualidade. Nada de mechas em Forgotten Realms, senhores e senhoras!
May Mardsen, por Nicodemus Flynn |
Além de entender o que está se passando na obra como um todo, é interessante sempre manter um contato apurado com o resto da equipe ao montar um personagem. A arte conceitual de um personagem é um passo super importante, e muitas vezes os diretores de arte, o game designer ou outros membros da equipe vão ter muito a falar sobre a aparência que o personagem deve ter. E trazendo para o âmbito amador, as vezes não vale a pena apostar em uma aparência que os seus modeladores não vão conseguir realizar.
Como bom exemplo, a Riot, empresa que faz o famoso League of Legends, recentemente realizou uma repaginada no visual de um dos campeões do jogo – Karthus.
Karthus, anterior a essa atualização, tinha um mote de “ossos à mostra” muito forte. Seu rosto era de fato um crânio. E sabe por quê? Por quê na época de sua criação, eles não conseguiam muito bem criar a pele ressecada e corrompida que hoje conseguem. Se quiser trabalhar com character design, lembre-se de não estar longe do grupo.
Agora, falando em RPG, ao criar a aparência de um personagem, seja o de jogador, ou um NPC do mestre, manter uma coesão com o resto do grupo é super importante. Não adianta ser um universo duro e frio, e você me vier com uma fofa estudante de colegial. (... pera.)
Certo, mas aparência não é tudo. A personalidade do personagem é tão importante quanto. Talvez você não queira saber qual a cor favorita daquele quinquagésimo monstro com asas do Ato IV do Diablo III, mas saber como ele se comporta em combate, se é agressivo ou cauteloso, não deixa de ser personalidade.
E quando vamos pensar em protagonistas ou antagonistas, ou então em personagens de um universo de RPG, aí as coisas ficam mais complexas. Eles têm que ser criados com cuidado, com delicadeza. Saber a história desse povo, por quê eles falam da maneira que falam, usam o que usam, são o que são, é de elevada importância. Nem todo mundo é Chronno, que nada fala! De novo, esse passo deve ser cuidadoso e conversado sempre com o resto do seu grupo ou equipe. Personalidade é uma coisa que todos têm, acredite ou não, e não conheço uma pessoa hoje que não poderia me dar umas boas ideias sobre a personalidade do meu próximo grande personagem na minha campanha de RPG.
Para exemplificar esse processo, chamo a atenção para o jogo Trine, 1 e 2. O jogo gira em torno de um grupo de três aventureiros, unidos por um artefato mágico, que são muito diferentes entre si, mas trabalham em conjunto como ninguém. Um mago, inteligente mas cauteloso e resguardado... Um guerreiro beberrão, que não fraqueja nem nas piores situações, e uma esguia ladina, ótima observadora e focada na tarefa à mão. Muito do atrativo do jogo é o quanto é divertido três personagens tão diferentes, unidos de maneira tão sobrenatural, terem que trabalhar em conjunto pra vencer os mais variados problemas. O game ainda conta com carismáticos vilões, e é um must play para quem gosta de plataforma!
Aparência e personalidade são elementos fundantes, mas você tem que se preocupar muito com a função que o seu personagem exerce. Qual a tarefa dele? Para quê você criou esse personagem ou grupo de personagens? Ser o protagonista? Ok, mas isso não responde muito. Alguns protagonistas servem pra mostrar o mundo de uma visão específica, outros servem só para você, jogador, inserir sua visão de mundo lá. Um bom exemplo é Chronno Cross. O protagonista, Serge, é um "protagonista mudo". Ele nada fala nas interações com o mundo, e temos uma liberdade para imaginação. Mesmo assim, o jogo tem uma grande gama de personagens com personalidades bem estabelecidas e muito cativantes. Kid, Lynx e todos os outros, são bem trabalhados e podemos ver a função de cada um deles de forma nítida. Lynx não é só o antagonista, mas também nos mostra uma versão alternativa de ver o mundo. Alguns personagens aparecem para dar uma variedade nas mecânicas de combate, e muitos desafios só seriam vencidos com uma boa combinação. Grande jogo, um dos meus favoritos.
Em um RPG de mesa, dar uma função ao personagem é algo bem complexo. Ele precisa viver por si só, já que o mundo dele gira! Mas também não adianta criar personagens sempre aleatórios. Veja o que quer mostrar com essa presença. Ainda mais se for um personagem importante na crônica - se eu criei um vilão, por exemplo, que tal eu tentar mostrar como seria uma sensação nobre, como a honra ou o amor, levada ao extremo? Pense sobre!
Mas então eu fico por aqui. Espero que essa reflexão te ajude a dar mais vida a seus personagens.